3.11.07

Mercado de Azeitão
FEIRANTES EXIGEM MELHORES CONDIÇÕES

Estradas por asfaltar, iluminação deficiente ou acessos vedados a ambulâncias são algumas das críticas que os feirantes em Azeitão tecem quanto ao estado do Mercado Municipal.
Tais lacunas afectam o negócio de alguns e podem mesmo ser fatais para a saúde de outros, como no caso dos óbitos que se deram no local e que poderiam (ou não) ter sido evitados caso a assistência médica fosse dada assim que o sinal de alerta disparado.

O Mercado de Azeitão é um mundo!

Ao primeiro domingo de cada mês a Freguesia de São Lourenço rebenta pelas costuras, enche-se de automóveis estacionados em cada recanto para que os seus tripulantes fiquem mais próximos dos acessos principais. A diversidade de aromas e apelos proliferam no ar, “ai que o cigano perdeu a cabeça! É só 5 euros! 5 euros, duas peças a escolher, oh freguês”!

A música a jeito popular invade os tímpanos dos consumidores domingueiros que rumam ao Mercado para ali resgatar artigos a preços mais competitivos que farão parte das suas casas, das suas vidas...

Se junto às principais entradas da feira os fregueses se atropelam e lutam por um lugar estratégico frente às bancas, nas ruas medianas a calmaria é senhora. Com menos confusão, menos gente e menos agrado, os feirantes vão contestando a falta de condições no recinto que não só afecta as vendas destes pequenos empresários como já chegou a não evitar situações de calamidade como mortes, em dias festivos.

Foi nessa zona central e menos movimentada que em pleno domingo de enchente o Nova Morada descobriu serenidade e tempo para ouvir os comerciantes dizerem de sua justiça.

Espetou estaca na perna
e teve de ir a pé até à ambulância

Foi há cerca de um ano que “uma senhora que vendia chapéus” foi surpreendida por um ataque na vesícula e levada “em braços” até à entrada, local mais próximo onde a ambulância consegue chegar. Acabou por morrer, situação que “poderia ter sido evitada caso os socorros chegassem mais rápido”, lamentou Solange, vendedora em mercados há mais de 30 anos, aliás, “desde que nasci, este negócio já vem dos meus avós e dos meus pais”, explicou.

Também esta feirante já foi apanhada num acidente de menor gravidade, “caí e espetei uma estaca na perna”, a lesão foi tal que levou dez pontos por dentro e outros dez por fora da canela. O pior foi que “tive de ir a pé até à ambulância”, recordou. Na opinião de Solange, “o Mercado de Azeitão podia ter mais condições”. A seu ver, a estreiteza das estradas é uma das questões urgentes a resolver. “Queremos sair a horas e não podemos porque as ruas não estão preparadas para esse fim e ficam tapadas”, para além da dificuldade em escoar o trânsito, as vias não estão alcatroadas, o que provoca lama no Inverno e pó no Verão.

“Não temos condições quase nenhumas, as casas de banho até são mais ou menos”, mas muitas são as arestas a limar.

Ana Maria discorda do estado dos lavabos públicos, a seu ver estão em condições degradantes e o estado da feira contrasta do preço cobrado, “pagamos uma fortuna”! Feirante desde os 18 anos, Ana Maria reclama a vinda dos fiscais, afinal “à entrada dos portões entra tudo sem cartões, a gente paga o nosso espaço e outros vêm para cá sem pagar nada”. No dia da visita do Nova Morada a mostra de roupa de criança vivia um dia positivo “hoje não é caso, mas chego a ter outras bancas à minha frente”, denunciou.

Viver das feiras,
Um negócio arriscado

Marta Custóias é vendedora há 17 anos e faz suas as palavras das vizinhas, “as condições do Mercado são precárias e ficam um pouco aquém do desejado”.

A questão das ruas alcatroadas volta à tona, “o mercado em si está muito mal distribuído e enfraqueceu muito desde que a rua principal foi alcatroada. As pessoas circulam ali e tendem a não vir para o meio da feira”, o resultado dos melhoramentos apenas nos acessos principais contribuiu para que “as ruas que eram muito boas fraquejassem imenso, como era o meu caso”, exemplificou.

Se a sua preferência era instalar a banca numa extremidade? Não! “O que pretendemos é que alcatroem estas ruas também”...

Segundo as feirantes abordadas, até à data os lamentos ainda não passaram para o papel, “para já ainda só falámos entre colegas”, declarou Marta Custóias, mas os comerciantes pretendem vir a expôr a situação à Junta de Freguesia de São Lourenço. Dizem os feirantes que os meses de Janeiro e Fevereiro, no Inverno e de Agosto e Setembro, no Verão, são os mais fracos a nível de clientela, mas poderiam ser compensados caso as ruas estivessem pavimentadas, afinal “as pessoas procuram andar em sítios mais limpinhos em vez de andar na lama”, defendeu Marta Custóias.

Enquanto Ana Maria aponta o Mercado de Grândola como o melhor, Maria Guincelda avança que “é a mesma coisa em todo o lado” e o pior é que “não se ganha nada”, este ramo já “não compensa, mas a nossa vida é esta”... Maria Guincelda e a filha Sónia ainda recordam o dia, há cerca de dois anos, “em que uma cigana idosa morreu com um ataque cardíaco”. A história faz parte da memória da maioria dos comerciantes que trabalham na zona mediana da feira: no decorrer de uma rixa entre dois homens, uma senhora sofreu do coração por julgar que um dos envolvidos era seu familiar. O socorro chegou rápido, mas a âmbulância não cabia no caminho, pelo que a mulher foi levada de maca, estrada fora, até à viatura dos bombeiros. Uma tragédia que vem, uma vez mais, dar mote à questão da falta de segurança. Por esse motivo ou por outro, Maria Guincelda assiste às negociatas do marido mas não se envolve nas vendas, “sou uma mulher doente”, explicou, mas ainda assiste às controvérsias, compreende que os compradores queiram passear no asfalto e defende que “os vendedores de roupa deviam estar todos juntos”, forma de não comprometer os comerciantes que se dedicam à mesma actividade.

A recessão económica é uma realidade confirmada pela maioria dos feirantes, se para Ana Maria “o negócio está a correr muito mal, muito mal mesmo”, para Solange “está muito parado” e apenas “dá para continuar com alguma dificuldade”.

Mas a luta continua e a insistência é rainha, a esperança da chegada de melhores dias vinga e a imaginação continua a combater certas rasteiras como as da meteorologia, “quando chove isto é um ribeiro de água”, mas vá lá que “o senhor dos tapetes trouxe para aqui palha para tapar os buracos e as poças”.

E assim se vai (sobre)vivendo (do) no Mercado...

Nova Morada, Edição nº 335, 2 Novembro 2007