27.1.08

E. B. 2+3 Paulo da Gama
AMIANTO AMEAÇA ESCOLA

O pavilhão desportivo da EB 2+3 Paulo da Gama, na Amora, é coberto por fibrocimento, uma mistura de cimento com cerca de 10% de amianto e cuja inalação pode provocar inúmeras doenças pulmonares, incluindo o cancro.

Ana Cristina, encarregada de educação e representante dos pais da turma do 7º. Sete e José Manuel Fernandes, professor aposentado (há um mês) da Instituição, uniram esforços e prometem avançar com um abaixo-assinado para que a cobertura seja retirada do gimno-desportivo.
O amianto é um mineral que, devido às suas extraordinárias propriedades mecânicas, químicas e por ser resistente a temperaturas elevadas foi usado com grande profusão entre 1945 e 1990, mas acabou por ser proibido na União Europeia em 2005, quando foram comprovados os seus efeitos nocivos.
Segundo a Organização Mundial de Saúde, todas as formas de amianto são perigosas quando os filamentos de dimensões respiráveis são inalados, se bem que nem todas as fibras constituam o mesmo grau de perigo. O risco de aparecimento de doença depende do tipo de fibra patente, das respectivas dimensões, da concentração e do tempo de exposição.
Em 2006, o Jornal de Notícias trouxe a público valores alarmantes para os encarregados de educação, avançando que "as coberturas de edifícios em fibrocimento existentes em Portugal equivalem a 600 mil campos de futebol".

”Existe uma Lei da Rolha imposta pelo Ministério”

O risco existente na Escola Paulo da Gama pode ser iminente, mas a dúvida persiste. Contactado pelo Jornal do Seixal (JS), o presidente do estabelecimento de Ensino, Fernando Tomás, recusou-se a prestar declarações sem a autorização prévia e efectiva da Direcção Regional de Educação de Lisboa e Vale do Tejo (DREL).
“Existe uma Lei da Rolha imposta pelo Ministério da Educação”, justificou José Fernandes, pelo que os educadores têm algum receio de comprometer “a profissão ou a carreira, mas também acho estranho que uma escola com boas iniciativas, bons professores e a favor dos alunos, esteja em silêncio”.
Joaquim Barbosa, director Regional adjunto da DREL avançou ao JS que a entidade "tem dado orientação aos Conselhos Executivos das escolas em que a comunidade educativa tem manifestado preocupação com o problema, que devem solicitar a uma entidade credenciada para o efeito, as análises consideradas necessárias para verificar se os limites se encontram cumpridos", procedimentos esses também, diz a DREL, aplicáveis à escola Paulo da Gama.
Certezas quanto à situação específica da Paulo da Gama não existem, mas conforme resolução da Assembleia da República n.º 24/2003, o prazo para se proceder à inventariação de todos os edifícios públicos que contivessem amianto na sua construção era de um ano - a terminar em 2004, ou seja, há mais de 3 anos atrás.
Conforme dados recolhidos junto ao estabelecimento de Ensino e apesar do silêncio (do Conselho Executivo) e receio (dos educandos) instalados, as análises já terão sido efectivadas há cerca de 3 ou 4 anos. Na altura, uma antiga funcionária - que pediu o anonimato - trabalhava no bar da EB 2+3 e recorda-se de lá terem sido colocados medidores para avaliar os níveis de amianto.
Já o professor aposentado não se recorda de tais medições, “há muitas coisas que se passam na escola que os próprios professores não têm conhecimento”.
No entender da antiga trabalhadora, não existe qualquer perigo, afinal "cheguei aqui há 12 anos, recordo-me dos aparelhos, mas nunca ouvi dizer que a Escola estava em risco".

Segundo a DREL de Lisboa e Vale do Tejo, já foram levadas a cabo algumas medições de fibras de amianto no ar, realizadas por uma entidade credenciada para o efeito, em algumas escolas e "os resultados situaram-se sempre muito abaixo do limite previsto no artigo 8º da Directiva 2003/18/CE, e no artigo 4º do Decreto-Lei nº 266/2007, de 24/7".

Fatal quando degradado

Conforme o JS apurou, o fibrocimento é constituído por cerca de 10 por cento de amianto, um valor cujos riscos de exposição se tornam preocupantes em caso dos materiais estarem degradados. A inalação do mineral pode provocar muitos casos de cancro do pulmão e não havendo manutenção das instalações o amianto pode constituir uma fonte de risco, sendo que as doenças surgem 10 a 15 anos depois da inalação. Nos casos de cancro, o crescimento incontrolável das células começa imperceptível e inicialmente não provoca incómodo, sendo os principais sintomas a tosse, falta de ar e dor difusa no peito.
No caso do Paulo da Gama, o alarme foi dado “por professores de várias áreas que disseram aos alunos para alertar os pais” para a situação, em especial para o pavilhão desportivo, se bem que todos os equipamentos existentes serão, alegadamente, cobertos por fibrocimento. A “Escola tem quase 30 anos e já chegou mesmo, em dias de fortes chuvadas, a inundar”, explicou José Fernandes.
Se o fibrocimento do pavilhão está degradado? “Sim! O meu filho indicou-me que o tecto do ginásio está-se a desfazer completamente”, afirmou Ana Cristina.
É por esse motivo que a representante dos pais do 7º. Sete se recusa a deixar os educandos a praticar desporto no pavilhão. Já a ex-funcionária, que também tem filhos na Paulo da Gama diz que "não tenho conhecimento de que as crianças possam dar faltas para evitar ter aulas de Educação Física" dentro do edifício, esclareceu.
Também Ana Cristina foi estudante na escola, numa altura em que o perigo do amianto era desconhecido… para já, não se recorda de nenhum colega ter, entretanto, contraído doenças do foro pulmonar. Ainda assim, com o passar dos anos a situação tende a piorar, devido ao envelhecimento dos materiais.

Amianto, o “inimigo invisível”

Quando os estudos encomendados por peritos da Comissão Europeia revelaram que o amianto pode ser responsável por meio milhão de mortes dentro de 15 anos, na Europa, foram impostas regras rígidas de segurança às empresas que lidam com a matéria. Na "legislação proíbe-se a colocação no mercado e a utilização de produtos que contenham fibras de amianto. Admite-se, contudo, que os produtos que já se encontravam instalados e ou em serviço antes da sua entrada em vigor, se mantenham até à data da sua destruição ou fim da vida útil", explicou o dirigente da DREL.
A Sociedade Geral de Superintendência (SGS) é uma empresa que analisa a presença de amianto em edifícios suspeitos, mede a qualidade do ar em locais onde foram utilizados materiais contendo amianto e inspecciona sítios onde este material é removido, antes, durante e após a sua demolição. No intuito de apurar a perigosidade da substância, o Jornal do Seixal falou com a engenheira Inês Baptista, especialista da SGS, que explicou que as placas de fibrocimento, por si só, “não têm problema”, a menos que estejam deterioradas, “porque as partículas são libertadas e inaladas”.
Depois de removido, os restos mortais deste "inimigo invisível" são levados para um aterro de resíduos, sem necessidade de segurança especial com o transporte.
Apesar do apelo ao não alarmismo, a Deco elaborou, no passado mês de Setembro, um estudo onde detectava problemas de construção e conservação dos edifícios, com presença de amianto em sete escolas nacionais. A própria sede da Comissão Europeia, edifício Berlaymont, em Bruxelas, viu-se obrigada a fechar as portas em 1991, devido à presença de amianto. Uma situação que muitas vezes é referida mas que se revela distinta da Paulo da Gama, pois Berlaymont era constituída por 90 por cento de amianto, contra a percentagem existente no fibrocimento.
Em Novembro, foi a vez do provedor da Justiça, Nascimento Rodrigues, recomendar ao Governo que fossem tomadas diligências para a realização de operações de remoção de amianto das escolas, hospitais ou edifícios destinados à prática desportiva.
À medida que os tectos se vão degradando, o perigo espreita alunos e funcionários, sem distinção de idades ou credos. O Ministério da Educação poderia ter um papel decisivo na resolução desta questão, mas ainda não teve oportunidade de ver, com os seus próprios olhos, as necessidades da Paulo da Gama, “há 3 ou 4 anos pedimos à Ministra que viesse ver à nossa escola e não veio, não vem à Margem Sul, só vai às escolas de elite”, lamentou José Fernandes.

Jornal do Seixal, edição nº. 32, 26 Janeiro 2007