10.12.07

António Narciso
CONTRA (O) ATAQUE DOS GRANDES

Chegou Dezembro, o fatídico mês da fraternidade e do consumismo... Enquanto muitos quintacondenses anseiam a entrada em cena das novas grandes e económicas superfícies comerciais, os pequenos comerciantes locais ganham resmas de cabelos grisalhos. António Narciso, pioneiro na Quinta do Conde, proprietário de um supermercado e presidente da Associação do Comércio e Serviços do Distrito de Setúbal, lamenta a chegada dos grandes e augura o excesso de oferta de Comércio para a reduzida densidade populacional na Vila que viu crescer. Através do Condense deixou sugestões aos empresários e um alerta à população em geral: “devemos impôr o produto nacional”!

O senhor Narciso é o actual presidente da Associação do Comércio e Serviços do Distrito de Setúbal. Quais são as competências dessa Instituição?
A Instituição representa todos os comerciantes junto das entidades oficiais, promovendo as actividades dentro das suas áreas e dando-lhes apoio jurídico e informações.

O que é que os comerciantes da Quinta do Conde podem esperar agora, que vamos contar com 2 novas grandes superfícies comerciais na Vila?
A entrada em vigor de 2 novos espaços comerciais é lamentável porque isso vem afectar o pequeno comércio. Há uns dias assisti na televisão a um debate sobre o trabalho e voltou-se a falar sobre o licenciamento e abertura de novos espaços comerciais ao abrigo da Lei de 12/2004 que neste momento está a ser aplicada. Concordo que os tempos evoluem e têm de se modernizar, mas o que é facto é que a Quinta do Conde não tem capacidade para tantos espaços comerciais, a densidade populacional não é suficiente para os alimentar... Penso que no futuro nem eles nem o pequeno comércio ficarão bem e o pequeno comércio vai ser a grande vítima de tudo isto. É lamentável porque as cidades e aldeias sem actividade comercial não têm vida própria, as coisas não se valorizam e é mau para a população em si.

De que forma é que a legislação protege os pequenos comerciantes perante esta ameaça?
Infelizmente não há Lei nenhuma que proteja o pequeno comércio. Andamos aqui há bastante anos, surgiram programas de apoio ao comércio mas a verdade é que esses programas fazem exigências que muitas vezes são difícieis de cumprir e para além disso, a falta de clientes na Quinta do Conde é uma realidade!

Os estabelecimentos na Vila estão de certa forma descentralizados. O que é que é necessário fazer para levar a população a sair de casa a pé, ver as montras, entrar nas lojas e comprar?
A Quinta do Conde cresceu à sua vontade e os pequenos comerciantes instalaram-se um tanto ou quanto desordenamente... hoje, não há um espaço onde fique concentrado um grupo de actividades comerciais para as pessoas fazerem as suas compras. O que é facto é que esta pulverização de comércio foi nascendo à medida da necessidade das ruas onde a população residia. Penso que há uma auto-suficiência de espaços comerciais na Quinta do Conde e não são necessários mais.

A vida nocturna da Quinta do Conde está bastante ligada aos bares alterne. Esse facto contribui de alguma forma para a fuga das camadas mais jovens para outros pólos comerciais?
A juventude tem de ser chamada a viver na sua terra. Penso que os grupos desportivos têm um papel importante nessa matéria e deveriam ser eles a criar incentivos e programas no sentido de, com harmonia e legalidade, chamar a si os jovens.
Há dias estive na ADQC (Associação de Desenvolvimento da Qta.do Conde) e fiquei maravilhado com o projecto para as novas piscinas. Aquele pólo de atracção e de lazer acrescido a um espaço de teatro e de cinema seriam essenciais para melhorar a vida nesta Vila.

Na passagem de ano, em Sesimbra, vão haver “100 mergulhadores, que à meia-noite em ponto, surgem debaixo de água com uma inscrição que dirá 2008”

Este é o primeiro ano em que a Câmara Municipal de Sesimbra vai financiar a iluminação de Natal. Em que é que este apoio pode beneficiar o comércio?
Todos os anos têm vindo a ser feitas iluminações promovidas pela Junta de Freguesia e pelos comerciantes. Este ano, a Câmara mudou um pouco de táctica e propôs às Associações de Comércio e de Serviços do Distrito de Setúbal e
dos Comerciantes e Industriais do Concelho de Sesimbra (ACIC) que fôssemos nós os orientadores da iluminação. Naturalmente as associações têm um maior poder negocial com as empresas que vão fazer as intervenções e o Município contribui com um donativo para apoiar as iluminações e o fogo de artifício. Posso dizer-lhe que a importância que é entregue às associações é uma verba muito baixa que já foi negociada e vai ficar em 25 mil euros, o que não chega para nada! As iluminações vão ser feitas na marginal de Sesimbra e num placar e em mais 4 rotundas na Quinta do Conde. É depositado numa outra conta da ACIC uma verba de 20 mil euros, incluindo iva, para pagar o fogo de artifício. Este ano, para além do fogo em toda a baía, vamos ter um espectáculo que conta com a presença de 100 mergulhadores, que à meia-noite em ponto, surgem debaixo de água com uma inscrição que dirá 2008. Penso que é algo inédito e que vale a pena...

Costuma dizer-se que “quem compra caro chora uma vez, quem compra barato chora a vida toda”. Defende a ideia de que o preço é sinónimo de qualidade?
Sabemos que o preço também se refere a qualidade.... uma roupa de qualidade tem de ter um preço diferente de uma de menor qualidade, tal como o calçado, os electrodomésticos ou as mobílias. No ramo alimentar, há uma ideia errada quanto aos preços praticados pelo pequeno comércio. Há até grandes superfícies comerciais que têm produtos mais caros do que no pequeno comércio, o que acontece é que exite uma informação incorrecta... quando a televisão divulga um preço bastante reduzido, o chamado dumping, isso pode ser considerado publicidade enganosa, porque nem tudo é barato e tem as condições apresentadas. Nem sempre aquilo que luz é ouro, tal como nem sempre a informação que passa na televisão é a correcta.

Dê-me o exemplo de um produto alimentar cujo preço compense adquirir no seu estabelecimento.
Há dias apercebi-me que vendia óleo Fula mais barato do que a concorrência, foi um cliente que me chamou à atenção... Temos valores normais que são competitivos, isso é um facto que se pode testemunhar.

As lojas de artigos chineses foram um atropelo ao pequeno comércio local?
Sim, os comerciantes fizeram bastantes queixas porque essa é uma concorrência desleal, é enorme e Oriental... uma concorrência que a nossa economia e produção não conseguem aceitar. Não sei como é que isto se vai resolver, mas aqui é essencial falar na qualidade-preço e as pessoas sabem que aqueles produtos têm dias ou horas de vida! Os produtos são baratos sim senhor mas não têm muita qualidade... o que é facto é que fazem uma concorrência enorme, destabilizam o mercado comercial e a produção que não consegue produzir a um preço competitivo...

“Se somos nós, portugueses, a querer ter trabalho, temos de consumir o que é nosso para dar trabalho a nós próprios!”

E em relação aos produtos de origem portuguesa? Se “o que é nacional é bom”, porque é que muitos dos nossos artigos têm tendência a ser mais caros do que os estrangeiros?
Eu como bom português que sou faço aqui um apelo a toda a gente: mais do que nunca, temos uma indústria e agricultura nacional em queda, no entanto, todos os dias chegam ao nosso país camiões de produtos estrangeiros que vêm de produtos comunitários... vamos falar em fruta e em hortaliças, porque é que a maior parte dos produtos que existem à venda são importados? Nada tem a ver com os nossos produtos nacionais e penso que se está na altura de apelar aos portugues para que consumam aquilo que é nosso, tanto em matéria da agricultura como na indústria. Se somos nós, portugueses, a querer ter trabalho, temos de consumir o que é nosso para dar trabalho a nós próprios! É evidente que ao comprar uma alface que veio da França, não estamos a dar trabalho a um português mas a um francês. É assim que devemos pensar, devemos impôr o produto nacional para dar trabalho à população do nosso país.

Com que incentivos podem contar as pessoas que neste momento queiram iniciar o seu próprio negócio?
Qualquer pessoa que queira iniciar actividade deve fazer uma coisa muito primária, que é dirigir-se à associação que a irá representar, no caso do nosso Distrito, a Associação do Comércio e Serviços do Distrito de Setúbal. Aí, temos técnicos que aconselham e indicam os apoios financeiros que os empresários podem ter, para além de todo o licenciamento necessário para pôr em prática os projectos.

Condense, edição nº 33, Dezembro 2007