10.2.08

Patrono 718 do CNE
VIAGEM AO MUNDO DO ESCUTISMO

O recém-nascido 2008 é o Ano Europeu do Diálogo Intercultural. A ideia é que, no decorrer dos próximos meses, cada cidadão tenha a oportunidade de inter-agir, partilhar experiências, aceitar e compreender cada semelhante, por mais curiosa que seja a sua individualidade...

O início do século XXI está marcado pelo receio do terrorismo, das catástrofes ambientais, dos fundamentalismos e de tantos outros medos que fazem perder rios de tempo, liberdade psíquica e até de dinheiro visando uma conquista (ilusória?) de estabilidade e segurança...

Apesar dos temores, pequenos gestos podem fazer a diferença e esse é o caso do Escutismo. O movimento celebrou um centenário em 2007 mas nem a sua longevidade o impede de crescer a olhos vistos, galgando barreiras e ganhando cada vez mais simpatizantes. De momento, o Corpo Nacional de Escutas (CNE) conta com cerca de 60 mil associados em Portugal. 122 deles, crianças na sua maioria, fazem parte do patrono 718, a Paróquia da Quinta do Conde.

Uma Missão centenária

Foi num domingo solarengo que o Condense se deslocou à Igreja da Nossa Senhora da Boa Água, na Quinta do Conde, para ali se encontrar com Luís Ribeiro, dirigente do agrupamento 718 do Escutismo Católico Português.

O 718 já não conta com nenhum dos seus fundadores, não por zanga ou fatalidade, mas para dar lugar aos mais novos, que um dia ensinaram. De acordo com Luís Ribeiro, “o Escutismo, para o adulto, é o que nós chamamos uma missão. A missão de tentar transmitir valores, ideais e experiências que vamos adquirindo ao longo dos tempos aos mais jovens. Quando vamos envelhecendo, passamos para a retaguarda e pedimos para que esses jovens, que foram crescendo também, dêem um pouco de si aos mais jovens do que eles.Esta não é uma missão humanitária em África”, explicou ao Condense, “mas é uma missão para com a sociedade e para com a fé católica”.

Para além do CNE, associado à Igreja, existem ainda os Escoteiros de Portugal, uma associação pluralista e dissociada de confissões religiosas “que infelizmente é mais reduzida”. Fora esta característica, os ideais não só são praticados de forma semelhante como derivam da mesma iniciativa.

A aventura teve início em 1907, pela mão do oficial inglês Robert Baden Powell, que na ilha de Brownsea, organizou um acampamento com vinte rapazes dos 12 aos 16 anos, onde transmitiu conhecimentos técnicos tais como primeiros socorros, observação e técnicas de segurança para a vida na cidade e na floresta. A experiência ultrapassou as expectativas, o ensinamento teve aprendizes e em 1923 Portugal juntou-se aos seguidores de Powell, constituindo o Corpo Nacional de Escutas que desde então “tem vindo a progredir e a aumentar”, conforme justificou Luís Ribeiro. Segundo o dirigente, neste momento “somos a associação juvenil portuguesa de maior dimensão”.

O chefe não tem dúvidas, “o Escutismo é uma maneira de estar na vida” e “nós tentamos dar uma educação alternativa aos jovens de forma a serem melhores indivíduos, melhores cidadãos, melhores cristãos e que aprendam, por um lado, a viver de forma mais autónoma e a desenrascarem-se sozinhos e a saber trabalhar em grupo”.

Alvorada para a vida

Para além dos trajes (in)formais, dos lenços e fitas específicos e aprumados, das peúgas, dos chapéus, ou dos cabelos desalinhados depois de esbarrar em qualquer ramo, o Escutismo “é uma educação alternativa ao que é ensinado em casa e na escola”. O envolvimento com a música, a natureza, as ‘ALVORAAADA’s’ - e neste caso, a fé cristã - tem em vista um ideal: “aprendemos essencialmente a gostar uns dos outros, a ajudar, a aprender certas técnicas de sobrevivência, a trabalhar e a viver com a natureza”.

O agrupamento 718 é composto por crianças e jovens dos 6 aos 22 anos e que estão divididos por escalões: os Lobitos dos 6 aos 10, os Exploradores dos 10 aos 14, os Pioneiros dos 14 aos 18 e os Caminheiros dos 18 aos 22. Aos 22 anos, os Caminheiros são convidados, na sua maioria, a juntar-se à equipa de animação dos adultos.

Os próprios elementos de cada um dos escalões são divididos em bandos, patrulhas ou equipas, em que cada um tem um cargo. No Escutismo há diversas ‘profissões’, o guia, o sub-guia, o secretário, o tesoureiro, o guarda material, o socorrista, o cozinheiro... “Eles vão trocando de posições ao longo dos anos de forma a terem uma vida em grupo, ajudando-se uns aos outros de forma a atingir uma meta comum, alcançando os seus objectivos não sozinhos mas numa espécie de equipa de trabalho”, avançou Luís Ribeiro.

De acordo com o dirigente do grupo, a vida de escuteiro/ campista não é fácil para os mais agarrados à protecção do lar ou ao vício da tecnologia. “Não há playstations nem computadores em campo, os escuteiros saem da comodidade da casa e vão viver para uma tenda ou um abrigo, o que não sabemos se um dia não virá a ser útil”. Além disso, “se aprendermos como a natureza funciona aprendemos a respeitá-la, estamos de certa forma a proteger o meio-ambiente”.

E porque, já diz o ditado, “é de pequenino que se torce o pepino”, assim que se integram no grupo, os Lobitos seguem para acampamento. É ali, em pleno campo de batalha, que têm de aprender certas técnicas, “como montar uma tenda, acender uma fogueira, montar uma mesa ou um banco só com paus e corda - as chamadas amarrações - que também possam ser desmanchados com facilidade”. Os nós têm uma utilidade e função específicas, devem ser feitos e desfeitos com relativa facilidade e ser fortes o suficiente para o tipo de função que vão exercer.

O Escutismo “prova que a vida não é só rosas ou facilidades”. Segundo Luís Ribeiro, “os raides a pé servem para os pôr a andar, mas não só. É também uma forma de lhes colocar dificuldades. A um dói-lhe as costas, ao outro os pés, mas juntos acabam por ultrapassar essas dificuldades”, justificou.

Por estranho que possa (ou não) parecer, o grande desafio que as crianças têm “é ir para a cama cedo”, tal é a adrenalina que o Escutismo lhes provoca.

Porque ser escuteiro é acima de tudo viver e conviver, o ano passado um pequeno grupo da Paróquia da Quinta do Conde viajou até Inglaterra, ao “Jamboree Mundial 2007”, outros foram ao “XXI ACANAC” em Idanha-a-Nova e a Drave (base nacional da 4ª Secção na zona de Aveiro), os Exploradores foram a sever do Vouga... Viajar é outro dos lemas, “tentamos de certa forma dar a conhecer um pouco do país e do Mundo ao agrupamento”.

Os ensinamentos do pai do Escutismo, Baden Powell, “ainda estão muito vivos”, defendeu Luís Ribeiro. Ainda assim, “tentamos adaptar a nossas metodologias para trabalhar com os jovens, temos uma formação permanente e os dirigentes não o são só pela idade mas pelas formações e experiências que vão tendo”.

O Escutismo segue uma metodologia e um sistema de progresso que “começa na idade do bronze e acaba na etapa de ouro”, o momento em que a maturidade e a experiência fazem das inocentes crianças de hoje os homens e mulheres (talvez mais solidárias) de amanhã.

Condense, edição nº. 35, Fevereiro 2008